Se você vier me perguntar por onde andei

O Brasil se perguntava por onde andava Belchior. E de tanto perguntar, o cabra finalmente apareceu. Apareceu tarde, já morto e — agora — enterrado. O jovem aspirante a filósofo que escreveu meia dúzia de canções geniais havia virado mendigo e desapareceu do mapa. Disseram que passou uma temporada no Uruguai. Que coisa curiosa! Quando fui buscar informações sobre o que tinha ocorrido, batata. Conheceu uma sirigaita. E se desviou deveras da vida ordinária que sempre levou.

Uma sirigaita meio intelectual, meio de esquerda. Como disse o outro. A moça virou a cabeça do cantor que já não a tinha lá muito no lugar certo. Nos seus últimos anos de vida, ele e a moça estavam com mania de perseguição. Desapareceram e viviam da ajuda de amigos e de ex-fãs compadecidos de sua miséria. É direito de todo mundo se cansar da vida de artista brasileiro: Domingão do Faustão, Serginho Groisman e Luciano Huck. Ninguém merece mesmo. Isso é tortura. Só suporta isso quem é retardado da cabeça, como o próprio Faustão e os artistas de novela. Meus Deus! Quando isso vai acabar, Senhor dos Exércitos?

Voltemos. Fato é que a moça apareceu e transformou a vida do cantor numa epopeia em busca do nada rumo a lugar nenhum. Belchior se transformou no homem de lugar nenhum, personagem daquela canção dos Beatles.

He’s a real nowhere man / sitting in his nowhere land / making all his nowhere plans for nobody.

Ora, queriam viver uma vida natural, uma vida desprendida? Que nada. Se quisessem teriam comprado um sítio escondido em qualquer lugar deste imenso país e teriam começado a criar galinhas. Mas, não. O sujeito se divorciou, deixou alguns filhos para trás. Abandonou um carro também, no estacionamento de um aeroporto. Para os filhos e para o estacionamento ficou devendo uma fortuna impagável. Coitado. Ficar devendo pensão alimentícia não é coisa de homem. Esquecer o carro na garagem do aeroporto é coisa que ninguém merece. Sinal de que pode ter batido a cabeça num poste. Por conta das dívidas e de um juiz diligente, teve as contas bancárias bloqueadas — e em todo o dinheiro que caía de direitos autorais os devedores passavam a mão. Justíssimo.

Resultado: morreu num sofá, longe da mulher que o arrancara da vida normal de artista que já descia a serra da fama. Morreu ouvindo música clássica. O Requiem, de W. A. Mozart? A 9ª Sinfonia de Gustav Mahler? Jamais saberemos.

Um vizinho meu que só escuta música baiana e sertanejo universitário todos os dias deu pausa. Passou o dia escutando Belchior. Pelo menos para isso a morte de um bom sujeito serve. Para dar um descanso nos nossos ouvidos.

Adeus, Belchior. E que o bom Deus aja contigo com justiça e misericórdia. Porque é assim que Ele sempre faz, ora. Ninguém pode dizer que não foi avisado. Claro.

Está comprovada a qualidade de nossas universidades

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Um fato ocorrido no final do ano passado comprova, se isso ainda fosse necessário, o alto nível de nossas universidades e seu comprometimento com a vida real. Trata-se de um incidente ocorrido na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Um estudante de Licenciatura em Dança — e eu aqui, caipira, nem sabia que isso existia — estava andando no campus e de repente, não mais que de repente, pisou no lugar errado e começou a tomar um choque monstro. O que seus coleguinhas fizeram? Ajudaram-no? Chamaram socorro? Não!!! Os colegas aplaudiram. Isso mesmo: os colegas aplaudiram, pensando tratar-se de uma performance. Caramba! Esfrego os olhos e não consigo acreditar. Mas leiam com seus próprios olhos a notícia que saiu no site do G1.

Mas por que isso é prova da qualidade do ensino universitário? Ora, os aplausos que o estudante recebeu são a prova viva da sensibilidade artística dos alunos daquela pocilga. Eu nunca imaginei que um curso de dança fosse capaz de estimular seus alunos a exaltar como manifestação artística digna de aplausos coisas simples da vida como tomar um choque. Hoje isso já é possível. Palmas para o Ministério da Educação.

O que aconteceu com a cultura brasileira

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Descobri esses dias, com grande atraso, um tal de Marcus Tardelli. Um violonista que faz Yamandu Costa (que é bão também) tremer nas bases. Aliás, ele é muito mais que um violonista. É um músico, ora. O Guinga disse que ele é o novo Mozart. Mas o Guinga não sabe quem é Mozart, pô. Então, deixemos o exagero dele para lá e ouçamos esse grande artista que é Marcus Tardelli (até o Milton Nascimento parou para ouvir — no estilo “quem não tem colírio usa óculos escuros”).

O que me importa aqui é perguntar: onde estavam MC Guimê, Luan Santana, Ivete Sangalo, e todos esses lixos, enquanto ocorria um evento como esse? Ah, vocês não sabem? Estavam enchendo o bolso de dinheiro, vendendo lixo para a massa. O povo brasileiro, nunca é demais lembrar, desenvolveu nas últimas décadas uma extraordinária capacidade de comer lixo. Por isso, Marcus Tardelli, Alessandro Penezzi e outros artistas são evidentemente desprezados pelas massas. Mas, quer saber? Fodam-se as massas. Foda-se o povo. Deixa o povo dançar na boquinha da garrafa e levantar as mãozinhas para o alto. O Brasil não se faz com o povo. Nunca se fez. O Brasil se faz com pessoas como Gian Corrêa e Raíssa Amaral. Aliás, pelo andar da carruagem, parece que o futuro do país está no interior: Petrópolis, Piracicaba, Passo Fundo, Caconde!

São jovens como esses, nas mais diversas áreas, que constroem uma nação. Uma nação se faz de pessoas que estudam e dedicam seu tempo a algo virtuoso. O resto são, na melhor das hipóteses, espectadores. Alguns nem isso são capazes de ser — e, portanto, merecem as nossas orações e o nosso mais profundo lamento. Quando a massa começa a falar e defender sua “cultura”, eu me lembro de Fernando Pessoa: amigos, vocês não nasceram para isso!

Mas o meu lamento não vai adiantar nada. Esses bostinhas vão continuar vendendo shows, DVDs, vão continuar fazendo campanhas publicitárias, vendendo refrigerante e cerveja e tudo vai continuar como está. Então tá. Eu só sei de uma coisa: cultura de massas é como quadrado redondo. Não existe. Ponto.

Neguinho não esculacha o Chico Buarque

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Chico Buarque e Caetano Veloso, olhando ‘o passarinho’ numa época em que ‘ser do contra’ era sinônimo de ser de esquerda.

Paris foi vítima de um ataque terrorista horroroso. Em novembro de 2015. Muita gente colocou para tocar Imagine, de John Lennon. Como quem diz: vejam como eu estou aí para salvar o mundo. Tipo: se todos fossem iguais ao John Lennon e a mim, a terra viveria em paz. É isso o que esses bobos querem dizer. Só que não é assim, todo mundo sabe. John Lennon era um cara raivoso. Basta olhar os dentes dele. Rangendo.

Isso gerou muito protesto contra o pacifismo boboca de John Lennon. Principalmente entre os conservadores. Os de direita. Aí eu digo: bater no John Lennon é fácil. Ninguém, ou quase ninguém, teve compromisso com a beatlemania. Cantar Twist and Shout na adolescência não compromete ninguém. Todos sabem.

Mas, vejam, uma coisa que eu tenho reparado nos conservadores. Digam se não tenho razão. É que esses putos, quando eventualmente falam mal do Chico Buarque, outro esquerdinha-caviar, usam um tom de voz tão ameno que só tenho uma explicação para o fenômeno: têm o rabo preso. Tenho certeza de que esses direitistas mal-resolvidos, mesmo sabendo que o Chico Buarque é um petista incorrigível, lembram-se de que já se empolgaram cantando Apesar de VocêO Que Será e Geni. E pior: que já se acharam inteligentes cantando Chico Buarque. E aí vem o paradoxo: como cuspir no prato que comi? Como jogar a pedra na Geni?

Como cuspir no cara que a minha professora de Português dizia ser um gênio do tamanho de um Dante Alighieri? Como bater em um cara que fez uma música em que todos os versos terminam em proparoxítona? Seria o cúmulo do máximo do escândalo.

(…)

Eu mesmo sofro desse mal. Confesso. Também já fui brasileiro, como Carlos Drummond.

O negócio é o seguinte: se você já curtiu Chico Buarque uma vez na vida, não vai adiantar agora tomar remédio. Você pode ter-se convertido ao catolicismo, pode ser leitor do Diogo Mainardi e pode já ter lido de cabo a rabo, por duas vezes, O Mínimo Que Você Precisa Saber Para Não Ser Um Idiota e tal. Mas você sempre ouvirá no fundo de sua mente a voz de Chico sussurrando na sua cabeça: quero ficar no teu corpo feito tatuagem, que é pra te dar coragem. E ele fica mesmo, grudado na memória afetiva e musical. É muito duro conviver com isso. Já tentei me livrar de suas musiquinhas com oração e jejum. Mas ele sempre volta: Você vai me seguir, aonde quer que eu vá. Para me livrar dele, tenho dado esmolas para os miseráveis. Mas a cada dia que passa vejo que o verdadeiro miserável sou eu.

A propósito: a única coisa que guardo, saudoso, de meus tempos de beatlemania é ter tido a oportunidade de ouvir I am The Walrus na voz de Jim Carrey. Simplesmente fantástico. E só. Tudo o mais é lixo.

Precisamos investir mais dinheiro na educação (5)

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Precisamos investir mais dinheiro na educação? Sim, precisamos! Mas não precisamos investir mais dinheiro público, não, seus putos. E, sim, o meu, o seu, o nosso dinheiro, e parte do dinheiro que a mulherada gasta com os cabeleireiros.

Sim. Por quê? Como não? Saiu no site da Veja: “As famílias brasileiras gastam, anualmente, 20,3 bilhões de reais com serviços de cabeleireiros, manicure e pedicure, segundo dados divulgados nesta terça-feira pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP). O número é 18% superior aos gastos com cursos regulares de educação (da pré-escola ao segundo grau), que somam 17,24 bilhões de reais por ano. O resultado também supera os 19,86 bilhões de reais, referente ao volume anual gasto com alimentos básicos, como aves e ovos.”

Maravilha. Lindo. É por isso que tem cabeleireiro de bacana ganhando R$50 mil por mês. Não sei o que será deste país quando a geração que atualmente está nas escolas tomar-lhes as rédeas. Quero estar longe. Vai ter muita gente reclamando: Ah, se minha mãe tivesse gastado menos dinheiro fazendo escova… Mas o problema nem é tanto esse, digamos, de natureza matemática. O problema é de concepção. Evidentemente concordo: beleza põe mesa, sim. Ninguém gosta de feiúra. As feias que me desculpem. Mas, pô, não dá para gastar com beleza, tipo, um terço do que você gasta com educação, dona, incluindo aí livros, cursos, transporte etc? Não dá? Você jura que tem que gastar mais com escova que com livros? Poxa, gente, coloquem a cabeça para funcionar!

Por um mundo melhor

programas

Alarico, se você pudesse eliminar alguma coisa do mundo, o que eliminaria?

Nunca pensei sobre isso. Vejamos…

(acende o cachimbo e assiste à fumaça subindo em direção ao Céu)

Bem, eu acho que o mundo seria um lugar melhor sem os programas de auditório.

Só isso? Então você eliminaria os programas de auditório?

Na verdade, não. Eu não os eliminaria. Eu os utilizaria de um modo mais interessante.

E como os utilizaria, Celestino?

Eu reformaria o Código Penal e os colocaria como pena criminal cumulativa. Tipo assim: Art. 155 — Subtrair coisa alheia móvel. Pena: de um a cinco anos de reclusão e ficar com a televisão ligada o tempo todo assistindo ao Domingão do Faustão.

Tenho certeza de que assim reduziríamos a violência neste país…

Eu também acho. O que ia dar de bandido safado-sem-vergonha tentando arrumar um emprego honesto não está escrito.

É. Não está escrito.

Deus é amor

Todo mundo sabe que Deus é amor. Mas não tem noção do que é isso. Caramba, Deus é amor demais da conta. Ninguém duvida que Ele tem os seus preferidos. Claro. Mas Deus ama a todo mundo. E isso é incrível. Principalmente quando você caminha pelos centros da cidade. Aí você fala: pô, Deus ama aquelas meninas que ficam vendendo cartão de celular na porta das Lojas Americanas. E não só. Ama também os camelôs que ficam vendendo pilhas da China (e dia sim, dia não, têm suas mercadorias apreendidas, com ou sem beó, pela polícia, mas no dia seguinte voltam a trabalhar). Ama o cara que fica soprando aquele negócio que coloca na boca e faz barulho de gato miando. E pior: Deus quer vê-lo no Paraíso (fico pensando: que tamanha transformação o amor de Deus fará neste caso!) Tem mais: Deus ama o cara que vai ao estádio na quarta-feira à noite para gritar pelo seu time. Deus ama os caras da Charanga do Mengão e os torcedores do Corinthians. Deus ama os caras que assistem ao Domingão do Faustão tomando cerveja de latinha. Pode? Ama o tiozão que pergunta em toda festa se é pavê ou pacomê (ama e, creio, até acha graça). Já imaginou Deus rindo disso? Os anjos servem a sobremesa e o cara pergunta: é pavê ou pacomê? E Deus cai na gargalhada… Deus ama as pessoas que falam vévi, que falam menas, que falam que o Vaticano deveria vender a Basílica de São Pedro e a Capela Sistina e doar tudo aos pobres. Deus ama as pessoas que usam crase antes de verbo. Deus ama os Djs e os cantores sertanejos. Deus ama os caras que ficam tocando Charlie Brown Jr. e dizendo que o Chorão era um gênio da poesia. Deus ama o Tico Santa Cruz e até mesmo o Gregório Duvivier. Duvidam? Pois durmam com um barulho desses! Deus ama os ressentidos e os dissonantes, os ateus e os fariseus, os escreventes e os delinquentes. Deus ama até o pessoal do Big Brother Brasil (de todas as edições, sem exceção — e isso inclui o Pedro Bial). Deus ama os escritores de livros de auto-ajuda e de empreendedorismo (e ama os leitores também). Me respondam, se puder: como não amar um Deus assim?

Causas da violência

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Fonte: http://casagrandedm.blogspot.com.br

Alarico, na sua opinião quais são as causas da onda de violência que assola o país?

Não é fácil dizer. Mas, em uma primeira análise, diria que é uma mistura de muitas coisas, entre as quais: o mito do policial amigo, a ideia falsa de que os direitos humanos estão aí para tirar vagabundo da cadeia, uma concepção angelical do ser humano, as secretarias de segurança pública, os sociólogos palpiteiros, líderes políticos avessos ao cumprimento da lei, policial corrupto que facilita para bandido, o Carnaval, a Corte Portuguesa e todos os vagabundos que vieram ganhar algum aqui e depois se mandaram e juiz bundão com medo do tribunal.

E a solução para tudo isso, Celestino, qual é?

Em primeiro lugar é preciso rezar e ter fé em Deus. Em segundo, saber que o crime sempre existiu e sempre existirá. E que não é função da lei propriamente acabar com o crime, mas reduzir sua prática a níveis aceitáveis. Depois, o seguinte: policiais cumpridores da lei, direitos humanos para as vítimas dos crimes (se sobrar energia, também para os bandidos condenados com trânsito em julgado), saber que o ser humano, geralmente, não presta, ter gente decente nas secretarias de segurança pública, acabar com os cursos de graduação em sociologia, ter líderes políticos cumpridores da Constituição e das leis, colocar policial corrupto para correr (sugestão: jogá-los em alto mar, sem bote), pular Carnaval somente nos quatro dias oficiais (os outros 361 dias podem ser leves, mas devem ser vividos com espírito ordeiro), colocar vagabundo aproveitador para correr (pode ser útil aproveitar a ocasião da remessa dos policiais corruptos ao mar e arremessá-los também), ter juízes machos que não puxam saco de desembargador.

“Precisamos investir mais dinheiro na educação” (3)

Neste terceiro post da série, você já deve estar convencido de que “precisamos investir mais dinheiro na educação”.

Para os que ainda não se convenceram, trago este vídeo — prova de que a falta de recursos financeiros está acabando com a qualidade de nossas escolas.

Esse professor safado, vejam só, está ferrado e mal pago. Por isso, caiu na malandragem. Houvesse mais investimentos na educação certamente ele estaria empenhado na exemplar formação de nossas futuras gerações. Como não há, ele faz o que faz.

Lamentável falta de investimentos na nossa educação. Quem tiver ouvidos de ouvir, que ouça!